29 de novembro de 2008

Devir Imóvel

Devir Curitiba lá longe onde nada move.
Onde ninguém mora o inverno não vem.

O inverno passou sem me olhar,
O que resta é o que devo.
A erudição é uma poda,
Pois não me movo.

A desesperança me compele ao escuro,
O cansaço ao silêncio.
O presente de amor morto existe lá fora.
Sou egoísta, não me movo.

Não tenho tempo, matei o amor, já disse.
O devir é um fardo,
O canto é consolo,
A mulher é fôlego.

Emprego é o abandono de deus ao homem.
A vida não é uma carreira de coca,
Mas o vulgo é uma farra
E o prazer existe.

Um turbilhão de sopros de cigarra
espreita a porta, não me movo.
Afloram risos, salve-se quem puder.
Não me movo.

O pecado horizontal é belo.
O que é lúbrico reaviva o corpo.
O que é híbrido enriquece a alma.
O que é dança liberta a palma.

Leio um livro errado.
Olho do alto o horizonte, um morro.
O sol não sai em Curitiba.
Não me movo solidariamente.

Alcalóide acalma,
Devaneio alegra,
Compra mata, mas a aparência engana.

A natureza cura.
Carne apodrece
Meu coração.
A culpa sara.

Os velhos perdoam.
As crianças crêem.
E os cegos amam.
Aprendo isto, mas não me movo.



Sou Curitiba.
Nada mais apropriado.
Imóvel. Novo
Sou um devir.

O verão finge,
Fingimos todos.
Nada mais apropriado.
Somos o devir.

Somos Curitiba.
Somos o inverno imóvel.
O inverno imóvel do amor morto.

O que é ao redor não importa.
Somos o devir.

Lemos Dalton.
Enquanto o batalhão em farra
Espera a volta do messias.

O inverno é que volta,
O devir acorda,
Deus não vem eu sei, porém
Não me movo.

15 de novembro de 2008

Por ser poeta me condeno ao escarro
De livre, em vôo, sepultado.
Entregue, me torno escravo.

Sensível, antes morro, mas não vos entrego aos ratos
Como me entregastes aos homens.
Do mundo corro.

Asas flageladas arrastam o asfalto.
Ares me esquecem o peito, que não sucumbe. A que escalada vã me condenaste? Quão alto?
Socorro...

Perpétuo filho do verso,
O papel é inalação assaltante,
Revido-te num roubo, um instante...
Arrasto-te...um eu lírico, um berro.

Descanso o baço,
E mesmo assim me esquece o fôlego,
Ainda sirvo, eis que sou ferro.

7 de novembro de 2008

carta testamento de um autor defunto a ser lido no sepulcro

Hora de ir afundado
Engatar a zero... zerar... as horas.
Suflar aliviado o corpo que não liberta também. Hora do mergulho terminal
Na sede que me afoga o ar na “goela”, a vala...
Tristeza pouco insiste na fala... é proa antiga em água lavada.
É um sorriso nos dentes e um correr infante.
Quando eu quiser correr por entre a vida...

escorrem...velas...

É a palavra o maior do risos emersos.
Palavras presentes nos pertences libertos do eu senhor...
Palavras presentes nos sons e incertezas do meu penhor.

Devo tanto quanto nego. A cara mal lavada não engana, pois.

Deixo a moratória para ser sustada das palavras que deixo sob a cômoda.
Palavras simples como não fui, palavras sem glória lapidadas neste enfermo.

Nossas certezas não têm fala, guarde isto no baú e ofereça aos filhos...
como um beijo de pater na testa, como um batismo.
Dê minhas palavras “aporia”... (termo para a não solução)

...escorrem...velas...

Num mergulho final, sacio a sede num desafogo do afago de palavras mudas.
Escorro e escorrem velas, maquiado imerso em túnica em fim de socorro.

Criança que virá em meu lugar, uma fala terna a me salvar deste dilúvio...
valentia.

1 de novembro de 2008

Esquina num balão pipa que perdeu o teto

Beijo cândido teu na esquina
é um segundo envolto em vácuo,
flutua no eco.
Amor é um balão sem teto.

Lábio rubro ameno,
O som do sim da tua boca
É corpo d’água em bica,
Encharco toda a chatice,
Se um som de sim tocar em troca.

Eu sei que cada esquina do meu peito
Vê miragem rota, vê o meu amar,
Mas sigo intacto, mas caminho.
Toda miragem é balbuciar uma loucura amante
em busca daquele beijo incerto,
em busca do primeiro gole flutuante
Da primeira esquina invadida.

Esquina em que me arrancaste
Chão, parede, teto.
Esquina para um jantar a dois:
Teu sim e teu sim também.

Esquina zepelim que te trouxeste,
que existe quando suo
sobre o teu cândido envolto em vácuo,
Esquina que te grita em afeto
para inundar amor em bica.

Esquina de que um dia, envolto em brita,
Partirei mais cego,
Trôpego em falsos rastros de um balão pipa,

Inundado em esquina ou a procura do teto...